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Foto do escritorEduardo De Oliveira

Brumadinho me salvou


Essa é uma história real que aconteceu comigo na última semana.


Há alguns dias atrás, publiquei em minha página pessoal em uma página de humor motociclístico, que eu estaria realizando uma viagem para a Argentina durante o fim de semana. E sim, a viagem já estava meio que toda programada em minha cabeça.

Na verdade não seria uma viagem, e sim uma fuga para a minha vida.

Desde o início do ano passado, só tenho tido perdas. Chega a ter ser controverso né, "ter" perdas.

Me programei para sair de moto, como um mochilão, uma barraca de camping, sacar todo o meu pouco dinheiro incluido cheque especial, e rodar até onde o dinheiro desse ou até onde a moto aguentasse.

Bom, como tenho três cachorras e uma gata, dei algumas instruções a minha tia que viesse aqui em minha casa e cuidasse dela. E claro, fui obrigado a mentir sobre a minha viagem para a minha tia, pois sei que ela nunca deixaria que eu fosse.


Enfim, estava decido a largar tudo e sair rumo a Argentina, torcendo para tudo de ruim acontecesse comigo no caminho, afinal eu já tinha perdido tudo na vida mesmo, perder a vida seria

só mais um detalhes.

A semana se passou a cada dia eu estava mais decidido a ir, porem alguma coisa, no ultimo instante me alertou na cabeça dizendo, "Vai pra Brumadinho"

Essa frase foi como uma explosão na minha cabeça. Pois já havia comentado com algumas pessoas que a minha vontade era ir lá e ajudar o povo da cidade. Já tinha até feito postagem em minha página, convocando moto clubes de Minas Gerais para que se mobilizassem com alguma ação social por lá.

Então já que eu tanto queria pegar a estrada, por quê não fazer isso com uma ação do bem?


Na sexta-feira a noite fui até o mercado e comprei aproximadamente uns 50kg de alimentos para levar. Cheguei em casa e separei algumas peças de roupas que praticamente não usava e separei para doação também. Então no sábado pela manhã, carreguei tudo na moto e segui rumo Brumadinho.

Mesmo não tendo tanto dinheiro em conta, na carteira e tudo mais, resolvi que essa era a coisa certa a ser feita. Rodei por quase 500 quilômetros até chegar a cidade, passei por seis pedágios, fiz apenas um lanche em casa e um almoço na estrada.

Muita subida, muita poeira, muito pó de minério na estrada, um pouquinho de chuva também, mas em fim consegui chegar a cidade de brumadinho sem maiores problemas.



Antes de chegar na cidade, você já nota a movimentação de helicópteros na região, vê também faixas de agradecimentos ao bombeiros heróis envolvidos e na entrada da cidade onde há o nome Brumadinho, você vê inúmeras homenagens feitas as vítimas da tragédia.

Você sente um clima muito pesado na cidade, ,aquele ar de tristeza e morte. mas também vê esperança com as pessoas que estão lá como voluntários ou levando doações.


Rodando um pouco mais pro centro, cheguei ao endereço que escolhi para deixar as minhas a doações. O local escolhido foi a ONG Centro Espírita Pai Joaquim de Aruanda,onde fui muito bem recebido pelo maestro Júlio Santos e sua esposa.

Tomamos um café com biscoitos e tivemos um breve e bom papo a respeito da situação da cidade e das famílias. Não pudemos conversar muito, pois eu tinha que retornar para casa, apesar do Julio me oferecer uma cama e comida para que eu ficasse. Pois eles ficaram preocupados deu pegar a estrada de volta no meio da noite e madrugada a dentro.

Então ele chamou o genro dele (acho que era genro sim rs), para que me conduzisse por um caminho de terra, que me deixaria muito mais a frente na BR 040. Como a tragédia destruiu também uma das estradas principais da cidade, você é obrigado a dar uma volta de mais de 80 quilômetros até chegar a Brumadinho.


Então fui para o off road, seguindo estrada a dentro no meio do mato e total escuridão, apenas com

a iluminação dos faróis da moto (para quem não sabe, é muito mais inferior que o farol de um carro). Muita poeira, uma coruja que bateu em meu capacete, algumas pontes que exigiam uma certa habilidade para passar, pedras soltas e você usando pneus que são apenas para o asfalto.

Bom, uma certa aventura, e como eu nunca fujo de um desafio, isso foi bem interessante de se fazer.

A única parte meio caótica, foi ter que passar por uma ponte elevada para pedestres. Dessa ponte amarradas que balançam de um lado para o outro. E foi nessa que eu acabei caindo com a moto, pelo fato do piso ser de metal, por estar meio molhado pelo sereno, pelo balanço da ponte e por estar com os pneus totalmente o oposto para aquele tipo de piso. Mas o tombo não foi dos piores, sequer me machuquei. Quebrou apenas um dos retrovisores e derramou um pouco de gasolina.

Seguimos até um certo ponto até onde eu poderia seguir sozinho até a BR 040.



Rodei a noite toda voltando para cara, parando apenas nos pedágios e em um posto para abastecer e fazer um lanche. E um pouco depois da divisa com Minas Gerais e o Rio de janeiro, a corrente da moto saiu, mas nada que 15 minutos de reparo não arrumasse.

Nesse momento no total breu da noite, pude ver o quanto o céu estava lindo e estrelado. Aquele momento que você não se importa com nada, apenas senta no meio fio, acende um cigarro e fica contemplando a beleza do céu e a quietude da noite.

Infelizmente não puder ficar ali sentado até amanhecer, tive que montar na moto, enfrentar os últimos 120 quilômetros de volta e pegar um pouco mais de frio na estrada.


O que eu posso resumir disso tudo?

Estava me preocupando apenas com o meu sofrimento e queria fugir de todo ele, mas ao invés disso, deixei o meu sofrimento de lado e fui ajudar quem realmente perdeu tudo na vida. Como casa, carro, filhos, esposa e marido, entes queridos...


Acabou que eu não fui ajudar Brumadinho, foi brumadinho quem me salvou!


Deixo aqui um grande abraço e meus sentimentos a todos da cidade de Brumadinho, e espero um dia retornar a cidade para uma ocasião melhor, tanto para vocês quanto para mim.

Um agradecimento especial pelo maestro Júlio Santos, sua esposa e genro, por me receberem tão bem, por me conduzirem pelo melhor caminho na minha volta e por todo o projeto social que eles fazem em brumadinho.

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